Parecia-me certo quando o Eusébio foi sepultado no cemitério do Lumiar que aquele não seria o local permanente para a sua sepultura, teria que ir para um local com mais visibilidade. Os líderes dos grupos parlamentares, já aprovaram a transladação para o Panteão Nacional. Não é o local onde o quero, é um lugar exclusivo, onde vai quem paga para entrar ou quem espera pelo domingo de manhã para não pagar; não é um local próximo do povo. Preferia vê-lo sepultado no Estádio da Luz, mas reconheço que o Panteão Nacional é o local onde merece estar.
A sua ida para o Panteão não será consensual, até há quem diga que a sua vida não se enquadra no espírito para o qual foi criada esta homenagem póstuma.
Vejamos o que diz a lei:
Lei n.º 28/2000 de 29 de Novembro
Define e regula as honras do Panteão Nacional
Artigo 2.º
1 - As honras do Panteão destinam-se a homenagear e a perpetuar a memória dos cidadãos portugueses que se distinguiram por serviços prestados ao País, no exercício de altos cargos públicos, altos serviços militares, na expansão da cultura portuguesa, na criação literária, científica e artística ou na defesa dos valores da civilização, em prol da dignificação da pessoa humana e da causa da liberdade.
2 - As honras do Panteão podem consistir:
a) Na deposição no Panteão Nacional dos restos mortais dos cidadãos distinguidos;
b) Na afixação no Panteão Nacional da lápide alusiva à sua vida e à sua obra.
Artigo 4.º
As honras do Panteão não poderão ser concedidas antes do decurso do prazo de um ano sobre a morte dos cidadãos distinguidos.
Nos últimos tempos ouvi dizer que o futebol não se enquadra no contexto da cultura portuguesa. Creio que quem o diz não tem estado muito ao tempo ao que se passa em Portugal e no Mundo desde o início do século XX. O futebol faz parte da cultura do povo, mais que qualquer outra forma de cultura. A meu ver Eusébio é elegível para o Panteão Nacional também como artista.
Até hoje tiveram honras de Panteão Nacional:
Na Igreja de Santa Engrácia, com sepultura:
1966 - Óscar Carmona, presidente da República (1869-1951)
1966 - Sidónio Pais, presidente da República (1872-1918)
1966 - Teófilo Braga, presidente da República (1843-1924)
1966 - Guerra Junqueiro, escritor (1850-1923)
1966 - João de Deus, escritor (1830-1896)
1966 - Almeida Garrett, escritor (1799-1854)
1990 - Humberto Delgado, opositor ao Estado Novo (1906-1965)
2001 - Amália Rodrigues, fadista (1920-1999)
2004 - Manuel de Arriaga, presidente da República (1840-1917)
2007 - Aquilino Ribeiro, escritor (1885-1963)
Na Igreja de Santa Engrácia, com cenotáfios:
Luís de Camões
Pedro Álvares Cabral
Afonso de Albuquerque
Nuno Álvares Pereira
Vasco da Gama
Infante Dom Henrique
No Mosteiro de Santa Cruz (em Coimbra):
Dom Afonso I
Dom Sancho I
Parece que os líderes parlamentares também aprovaram a transladação de Sophia de Mello Breyner para o Panteão Nacional.
É fácil notar a ausência de algumas grandes figuras da nossa história, creio que cada um terá as suas preferidas, aquelas a que dou mais relevância são o Aristides de Sousa Mendes, Fernando Pessoa (cenotáfio, está sepultado no Mosteiro dos Jerónimos, local de proeminência), Gil Vicente (cenotáfio, já que duvido que alguém saiba onde está enterrado ou até que haja uma sepultura) e Pedro Nunes (mesmo caso de Gil Vicente). Segundo sei, o Saramago não queria ir para o Panteão Nacional. As famílias das pessoas vítimas de lobotomia não concordariam com a ida de Egas Moniz. No entanto, a ausência de outros não deve ser a razão para a ausência de Eusébio do Panteão Nacional.
No ano passado foi recusada a transladação de duas personalidades por razões financeiras, o político Passos Manuel e o compositor Marcos Portugal. Então se estes foram recusados, porque razão há-de Eusébio, ainda no mesmo período de crise económica ser transladado? A meu ver a questão ultrapassa os motivos financeiros. Do político poucos serão os portugueses que tenham conhecimento dele sem ser pelo nome do Colégio. Do compositor menos serão ainda os que ouviram falar dele, quanto mais ter conhecimento da sua obra, apesar de grande parte da sua obra ter sido efectuada no Brasil, não é um compositor reconhecido internacionalmente. Já ouvi música composta por ele e gostei, mas não é equiparável a Strauss, Tchaikovsky, Mozart ou Beethoven, era o melhor que tínhamos. É como nós termos o Marco Paulo e os outros (o mundo) o Tom Jones ou o Júlio Iglésias. O Eusébio todos os portugueses sabem quem é (e continuarão a saber enquanto houver futebol), grande parte do mundo sabe quem ele é. É equiparável aos melhores de sempre.
A quantidade de homenagens, notícias e reportagens pelo mundo fora mostraram o respeito que havia por Eusébio, não foi só o futebol nacional que perdeu uma lenda, foi também o futebol mundial. Faleceu um jogador respeitado pelas qualidades futebolísticas, mas também pelo que representava e pelo desportivismo que demonstrou durante a sua carreira.
Já ouvi questionar a ida de Amália para o Panteão Nacional para mostrar como ilegítima a ida de Eusébio. Quando esta foi transladada, essa decisão parecia - e bem - consensual, até porque não existem fãs de editoras como existem de clubes de futebol. O fado, hoje é património imaterial da humanidade, faz parte da cultura portuguesa, está associado a Portugal, faz todo o sentido que a sua maior representante e fenómeno de popularidade tão grande esteja nesse local de homenagem. O futebol é de todo o mundo, não faz parte apenas de uma cultura. A Amália e o Eusébio foram os maiores representantes da cultura portuguesa durante o século XX.
No entanto, parece que essas pessoas não se incomodam que estejam lá o Aquilino Ribeiro, um dos responsáveis pelo regicídio de 1908, o Óscar Carmona, presidente durante a Ditadura Militar e durante o Estado Novo, ou até o Sidónio Pais, uma figura controversa no seu tempo que exerceu o poder de forma ditatorial.
Até o disparate de que não nasceu em Portugal e não era português já ouvi como argumento de oposição à sua ida para o Panteão Nacional. Quando esse argumento xenófobo - e errado porque era português - é o melhor que se consegue arranjar, então é porque até na opinião dessas pessoas ele tem méritos suficientes para a sua elegibilidade. Os franceses, também correctamente, deram honras de Panteão a Marie Curie. Outros mostram-se desagradados com o que o Rei disse depois da sua carreira futebolística, muito por culpa de
mau jornalismo, querendo acreditar piamente em citações falsas para denegrir o carácter do Rei.
Mesmo que Eusébio não fosse transladado para o Panteão Nacional, não acredito que ficasse eternamente no cemitério do Lumiar, o SL Benfica teria a responsabilidade de lhe erigir um monumento fúnebre de acordo com a sua glória.
PANTEÃO BENFIQUISTA
Apesar de não me parecer possível devido aos custos e ao acordo entre familiares de algumas personalidades já desaparecidas há muito, seria interessante a existência de um Panteão do SL Benfica.
Para começar, seleccionei 10 personalidades que homenagearia lá:
Cosme Damião, Félix Bermudes, José Maria Nicolau, Guilherme Espirito Santo, Otto Glória, Béla Guttmann, José Águas, Borges Coutinho, António Livramento, Eusébio.
Quem escolheriam vocês?